domingo, 10 de junho de 2012

Como inventar a democracia do amanhã face ao desafio da farsa democrática

Samir Amin

2012-03-03, Edição 41

http://www.pambazuka.org/pt/category/features/80404

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cc Sokwanele
Ante o que ele chama de a “farsa democrática”, Samir Amin levanta uma questão essencial: “Renunciar à [ao processo de] eleição?” A resposta é negativa, porém induz a nova interrogação: “Como associar as novas formas de democratização – ricas e criativas – permitindo assim que se faça da eleição uma prática diferente daquela concebidas pelas forças conservadoras?” Para Amin, este é o desafio.
O sufrágio universal é uma conquista recente, desencadeada pelas lutas dos trabalhadores no século XIX em alguns países europeus (a Inglaterra, a França, os Países Baixos e a Bélgica) sendo depois gradualmente estendida ao mundo inteiro. Hoje se afirma praticamente por toda a parte do planeta que a reivindicação do poder supremo delegada a uma assembleia eleita corretamente sobre uma base pluripartite – seja essa assembleia legislativa ou constitucional conforme as circunstâncias – define a aspiração democrática e, acrescento, assegura essa pretendida realização.

Até Marx colocara grandes esperanças nesse sufrágio universal como “possível caminho pacífico rumo ao socialismo”. Eu escrevi que, neste ponto, as expectativas de Marx foram desmentidas pela História. (cf. Marx e a democracia).

Creio que a razão dessa falha da democracia eleitoral não é difícil de desvendar: até o dia de hoje todas as sociedades são fundadas sobre um sistema de dupla exploração do trabalho (quaisquer que sejam as formas) e de concentração do poder do Estado em benefício da classe dirigente. Essa realidade fundamental produz uma relativa “despolitização/desculturalização” dos segmentos mais amplos da sociedade. E essa produção, amplamente concebida e colocada em funcionamento para cumprir a função sistematicamente esperada dela, é simultaneamente a condição de reprodução do sistema, sem [o risco de] mudanças “que ele não possa controlar e absorver, sem abalar a condição de sua estabilidade. Isso é o que se define como “o país profundo”, ou seja, o país profundamente adormecido. Nessas condições a eleição por sufrágio universal é garantia da vitória do conservadorismo (um dia reformador).

Assim se explica por que jamais na História houve mudança produzida por esse modo de gestão fundamentada sobre o “consenso” (o de não mudar). Todas as transformações portadoras de padrões transformadores sempre surgiram como produto de lutas conduzidas por aqueles que, em termos eleitorais, podem aparecer como “minorias”. Sem a iniciativa de tais minorias, elemento motor da sociedade, não há transformação possível. As lutas em questão, deflagradas conforme algum padrão, sempre terminam – quando as alternativas que elas propõem são clara e corretamente definidas – por constituir as “maiorias” (silenciosas no início do processo), pois de fato elas são em seguida endossadas pelo sufrágio universal que vem após – não antes – a vitória.

No nosso mundo contemporâneo o “consenso” (cujo sufrágio universal define as fronteiras) é mais conservador do que nunca. Nos centros do sistema mundial esse consenso se mostra pró-imperialista. Isso não no sentido de que implique necessariamente no ódio ou no desprezo de outros povos, suas vítimas, porém, num sentido mais banal, isso significa que a permanência da punção da renda imperialista é aceita por que ela representa a condição de reprodução da sociedade em seu conjunto, a garantia de sua “opulência” fazendo contraste com a miséria dos outros. Nas nações periféricas as respostas dos povos ao desafio (o da pauperização produzida pelo desenvolvimento da acumulação capitalista/imperialista) permanecem confusas, no sentido de que misturam-se sempre com uma dose de ilusão nostálgica fatal. Nessas condições o recurso à “eleição” sempre é concebido pelos poderes dominantes como meio par excellence de deter o movimento, isto é, de pôr um termo no potencial de radicalização das lutas. Elections, piège à cons (eleições, armadilhas para conspirações) afirmavam alguns em 19689 após confirmação pelos fatos. Em suma, uma assembleia eleita hoje na Tunísia e no Egito para acabar com a “desordem” estabiliza uma situação. Cria-se o paradoxo de mudar tudo para nada mudar.

Matéria completa: http://www.pambazuka.org/pt/category/features/80404

sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Africanidades, territórios e identidades

O escritor, músico e poeta Nei Lopes fala sobre africanidades, territórios e identidades da cultura negra no Rio de Janeiro.




sexta-feira, 8 de julho de 2011

O mais novo país do mundo

Governo de Cartum reconhece novo Estado do Sudão do Sul


CARTUM - O governo do Sudão reconheceu nesta sexta-feira, 8, o novo Estado do Sudão do Sul, que proclamará sua independência neste sábado, anunciou o ministro sudanês de Assuntos da Presidência, Bakri Hassan Saleh em entrevista coletiva. "O Executivo sudanês está disposto a cooperar com o novo Estado", afirmou Saleh perante os jornalistas na capital, Cartum.
Saleh afirmou que Cartum reconhece o Sudão do Sul como "um Estado independente e soberano", de acordo com a linha que separava os dois territórios em janeiro de 1956 - quando o Sudão tornou-se independente do Reino Unido - e em concordância com as leis internacionais.
Além disso, o ministro expressou o desejo de Cartum "de manter excelentes laços com o Estado do sul" e de resolver assuntos pendentes no que se refere às fronteiras, águas, petróleo e dívida externa. Ele também pediu ao governo de Juba a reconhecer os acordos e tratados contraídos com o Executivo sudanês.
Guerra civil
O norte e o sul do Sudão se enfrentaram durante 21 anos em uma guerra civil, iniciada em 1983, que deixou mais de 2 milhões de mortos e que culminou com os acordos de paz de 2005.
Os pactos estipulavam a realização de um referendo de autodeterminação no sul, que aconteceu em janeiro passado e terminou com arrasadora vitória "sim". Como resultado, o Sudão do Sul proclamará no sábado sua independência em cerimônia na cidade de Juba, a nova capital.
Capacetes azuis
O Conselho de Segurança das Nações Unidas aprovou nesta sexta por unanimidade a criação de uma nova missão de paz no Sudão do Sul, que será formada por 7 mil capacetes azuis e com a qual se espera contribuir à paz e à segurança do novo país.
O principal órgão de segurança internacional assinalou que a missão contará ainda com 900 civis e destacou o papel que a ONU tem junto às novas autoridades do Sudão do Sul para consolidar a paz e impedir a violência no novo país africano.

 Tópicos: , Internacional, Geral

Fonte: http://www.estadao.com.br/noticias/internacional,governo-de-cartum-reconhece-novo-estado-do-sudao-do-sul,742402,0.htm

segunda-feira, 20 de junho de 2011

Rumo a novos continentes

Martin Paetsch (Texo) e Dan Kitwood (Fotos)
         
O povo sã é um dos mais antigos da Terra, suas raízes remontam quase até a origem do anatomicamente moderno Homo sapiens. Alguns membros dessas tribos de bosquímanos vivem até hoje como nos primórdios da humanidade, por exemplo, na região sul-africana do Deserto do Kalahari
O SOL queima inclemente sobre os homens que marcham pela paisagem ressequida. Sobre os ombros eles carregam longas lanças de madeira; fora isso, levam pouca coisa consigo. São bosquímanos do povo sã, caçadores e coletores do Deserto do Kalahari, no sul da África. Eles procuram pistas e observam atentamente o chão.
Ninguém fala. Por fim, um deles faz um sinal com a mão; seus dedos imitam a forma retorcida dos chifres de um antílope kudu. Ele descobriu na areia os rastros de toda uma manda.
Em marcha acelerada os caçadores seguem a pista até que um único rastro se desvia para o lado. Os homens sabem: ele pertence ao animal mais fraco do grupo, que quer se esconder num matagal próximo.
                                                             
    Há 1,5 milhão de anos o fogo é uma das descobertas mais importantes da humanidade. Ele aquece, espanta animais predadores e torna a carne grelhada mais facilmente digerível. No entanto, somente o Homo sapiens é o primeiro a utilizá-lo, também, para fins ritualísticos
Mas nem esse antílope exausto é uma presa fácil. Somente o melhor corredor entre os homens o persegue através do calor insuportável da areia, por meio de moitas de capim alto e arbustos espinhentos. Ele espanta o animal diversas vezes, sempre que este procura descansar em alguma das escassas sombras.
A caçada dura horas a fio. É uma árdua corrida que pode ser fatal para ambos. Se o perseguidor superestimar suas forças ele mesmo pode ter um colapso. Uma insolação a 40°C no meio do deserto pode significar o fim.
Mas ele conta com uma vantagem decisiva: seu corpo é capaz de compensar o calor por meio do suor. O antílope, por outro lado, é obrigado a descansar na sombra para se resfriar, e são precisamente essas pausas vitais para tomar fôlego que o caçador interrompe incessantemente.
Subitamente, ele tem sucesso. O animal, completamente esgotado, está diretamente à sua frente. O homem levanta sua lança e a crava profundamente no corpo do animal.
Esta é uma forma milenar de caçar; talvez a mais antiga da História. Alguns sãs ainda perseguem suas presas do mesmo modo arcaico, inclusive sem arma alguma. Eles simplesmente acossam o bicho até a morte, provavelmente como fizeram seus ancestrais. Há dezenas de milhares de anos.
A uma época em que na África surgiu um humanoide com cérebro volumoso e rosto achatado: o anatomicamente moderno Homo sapiens, do latim, ‘homem sábio’. A expressão "anatomicamente moderno" significa que o esqueleto desse humanoide não difere mais do homem atual, ao contrário das formas ‘arcaicas’ de Homo Sapiens, que eram nitidamente mais robustos e muito mais antigos.
Arcaico ou moderno, não importa, o sapiens não foi o primeiro da espécie Homo. E nem o único a habitar a Terra. Naquele tempo existiam também, por exemplo, o Homo neanderthalensis e Homo erectus.
Mas o que o Homo sapiens fez de tão diferente? O que lhe permitiu sobreviver, ao contrário de todas as outras espécies humanoides?
Evidentemente não existem registros nem transmissões orais daquele período. Restaram apenas fragmentos de ferramentas e ossos preservados durante éons. E as peregrinações pré-históricas deixaram marcas no genoma dos povos atuais.
Por essa razão, os paleontólogos conseguem reconstruir a história de nossa espécie, ou pelo menos de seus elementos rudimentares, por meio de achados arqueológicos e análises genéticas.
OS ESQUELETOS MAIS ANTIGOS do moderno Homo sapiens foram descobertos na região do Rio Omo, na Etiópia e datam de 200.000 anos atrás. Naquela época, o vale do Omo ainda era notavelmente mais verde e menos árido e ressecado do que hoje. Manadas de búfalos, zebras e girafas transitavam pelo suculento capim. Nas florestas próximas viviam porcos-selvagens-gigantes e delicados antílopes. O rio era rico em percas-do-nilo, peixes-gatos e outras espécies písceas de grande porte.
Esse éden pré-histórico também era habitado por seres humanos que provavelmente seguiram as manadas de animais em suas caminhadas anuais até a região. Talvez eles perseguissem zebras até a exaustão e a morte, como os sãs fazem até hoje.
O aspecto dos caçadores do Rio Omo era diferente do de seus ancestrais. Sua estrutura óssea era mais delgada e eles tinham protuberâncias menos acentuadas acima dos olhos. Suas testas eram mais altas, o nariz menor, e no maxilar inferior já se delineava um queixo. É possível que esses traços não tenham se desenvolvido muito tempo antes, pois um de dois esqueletos, preservados em camadas sedimentares de lama perto do antigo leito do rio, ainda revela traços arcaicos, portanto, a inédita forma do corpo poderia estar apenas começando a se impor na população.
O segundo esqueleto, mais desenvolvido, mostra ainda que alguns dos primeiros representantes do Homo sapiens mal se diferenciavam externamente do homem atual. Se fossem transportados para o presente, provavelmente não chamariam atenção.
Eles se pareceriam conosco.
Os homens do Omo também apresentavam aquele trato vocal que, hoje em dia, nos permite gerar uma série de sons diferentes. E o espaço interno de seus crânios possibilitou a acomodação de um cérebro de tamanho e forma iguais ao nosso. Em suma: a estrutura anatômica dos hominídeos do Rio Omo provavelmente se diferenciava muito pouco da nossa. Mas será que eles já falavam e pensavam como nós?
Quase nada indica para um grande salto no desenvolvimento cultural desses primeiros seres humanos. Como seus ancestrais, eles fabricavam as conhecidas clavas e algumas ferramentas mais elaboradas de pedra. Não existe nenhuma indicação de que houve uma profunda e decisiva virada espiritual ou tecnológica. Nada nos hominídeos do Omo deixa presumir que com eles surgiria um futuro conquistador da Terra. É provável que eles tenham vivido exatamente como seus ancestrais diretos: eles caçavam com a lança, dominavam o fogo e talvez já sepultassem seus mortos.
Mas eles não os enfeitavam como os seres humanos fariam logo depois deles. E até hoje não foram encontrados objetos de arte que pudessem indicar um rico universo imaginário.
Aquela espécie que pisou no palco da evolução há exatos 200.000 anos atrás já possuía os pré-requisitos para desenvolver uma língua e um raciocínio modernos, mas tudo indica que ela não se valeu desses talentos durante muito tempo.
          
           À luz de uma fogueira, homens do povo sã participam de um cerimonial noturno de dança. Para eles, as danças frequentemente têm por fim atingir um estado de transe e, em muitas comunidades estão vinculadas à caça
AINDA ASSIM, no decorrer dos próximos 80.000 anos esse humanoide de aspecto moderno se espalhou por toda a África. E na região norte ele já começava a empreender os primeiros avanços rumo a um outro continente: o Oriente Médio, a parte ocidental da Ásia.
Nessa jornada os coletores e caçadores provavelmente apenas seguiram as manadas de animais de caça rumo ao norte. E, na futura região de Israel, eles devem ter encontrado, pela primeira vez, humanoides estranhos. Parentes distantes que tinham um aspecto parecido com o deles, mas que ainda assim eram diferentes: os Neandertalenses.
Esses caçadores, de estrutura física mais robusta e habituados a um clima mais frio, viviam de modo semelhante ao Homo sapiens e caçavam os mesmos animais. Durante milhares de anos as duas espécies possivelmente habitaram a mesma região no Oriente Médio.
Mas será que procuraram se comunicar? Eles se evitavam? Lutavam uns contra os outros? Aparentemente, os vizinhos mantiveram um relacionamento que nem sempre foi hostil. Talvez até trocassem informações sobre suas conquistas técnicas, pois muitas de suas ferramentas são incrivelmente parecidas.
                       
 Somente poucos sãs ainda vivem como os primeiros Homo sapiens, como caçadores e coletores nômades. Hoje em dia, muitos se fixaram em assentamentos simples e permanentes
E talvez esses vizinhos distintos também se acasalassem ocasionalmente, pelo menos é o que algumas pistas genéticas deixadas pelos neandertalenses em nosso próprio genoma levam a supor. Nada indica que o Homo sapiens de aspecto moderno tivesse uma vantagem; pelo contrário, os Neandertais provavelmente até fabricavam as pontas de lanças mais elaboradas.
E talvez esses vizinhos distintos também se acasalassem ocasionalmente, pelo menos é o que algumas pistas genéticas deixadas pelos neandertalenses em nosso próprio genoma levam a supor. Nada indica que o Homo sapiens de aspecto moderno tivesse uma vantagem; pelo contrário, os Neandertais provavelmente até fabricavam as pontas de lanças mais elaboradas.
Ou os Neandertalenses, aqueles caçadores robustos e habilidosos, adaptados ao frio, simplesmente fossem superiores a eles.
MAS NA ÁFRICA fermentava uma reviravolta; uma revolução que mudaria fundamentalmente o comportamento do ser humano e que lhe daria uma vantagem decisiva sobre os Neandertalenses. Eles aprendem a raciocinar de modo mais complexo e a se comunicar melhor e descobrem uma espécie de "espírito de equipe".
Há cerca de 75.000 anos, essas alterações já não passam mais despercebidas e seres surpreendentemente avançados vivem na África do Sul. De seu abrigo, nas cavernas de Blombos, a 300km a leste da atual Cidade do Cabo, esses hominídeos conseguem enxergar o Oceano Índico. Eles coletam moluscos e conchas em nas praias e pescam peixes. E trazem antílopes-anões (dik-diks) e tartarugas na volta de suas caçadas.
Os habitantes de Blombos são artesãos habilidosos: de ossos de animais eles esculpem sovelas (espécies de agulhas) com as quais talvez costurem roupas e embornais. Suas ferramentas aparentemente são confeccionadas em várias etapas. As mais recentes pesquisas indicam que eles possivelmente empregavam um método para polir e alisar as superfícies das ferramentas como até agora só se conhecia em artefatos provenientes da Europa e das Américas, e de um período muito mais recente, entre 20.000 e 10.000 anos atrás.
E eles fazem algo que jamais deve ter ocorrido aos seus ancestrais: eles produzem ornamentos, joias, portanto, bens que aparentemente não têm nenhuma utilidade prática. Para isso, eles perfuram conchas com uma ponta de osso ou uma pedra e as enfileiram em tiras (provavelmente de couro) para fabricar pulseiras ou colares.
Esses enfeites de conchas estão entre os ornamentos mais antigos de que se tem conhecimento. Mas por que essas criaturas subitamente começam a produzir coisas de que não necessitam para sua vida cotidiana?
É provável que os colares sejam muito mais do que apenas peças de decoração. Ornamentos semelhantes ainda são usados hoje em dia pelos sãs: aquele que receber um artefato de presente é obrigado a proteger e auxiliar o presenteador em momentos de necessidade; por exemplo, compartilhar com ele o produto da caçada. Desse modo, até os sãs, denominados bosquímanos (habitantes da floresta), constroem uma rede de segurança social vital para sua sobrevivência e uma união mais coesa.
Os colares dos homens de Blombos também seriam essa espécie de "penhor de amizade"? Os achados pelo menos deixam supor que os homens da Idade da Pedra já possuíam uma cultura que se assemelhava aos povos primitivos atuais.
Os colares dos homens de Blombos também seriam essa espécie de "penhor de amizade"? Os achados pelo menos deixam supor que os homens da Idade da Pedra já possuíam uma cultura que se assemelhava aos povos primitivos atuais.
E eles até decoravam alguns dos lindamente coloridos pedaços de ocre.
Depois de alisarem cuidadosamente um lado da pedra, eles faziam ranhuras profundas nessa mesma superfície.
Com essa técnica os sul-africanos ainda não criavam obras de arte complexas; nada comparável àquelas representações que seus descendentes pintariam milênios depois em paredes rochosas dentro e fora de cavernas. De início, eles produzem apenas modelos de grades simples, cujo significado permanece um enigma até hoje. Mas os enfeites de conchas e os pedaços de ocre decorados deixam reconhecer uma transformação elementar: esses seres humanos já pensam simbolicamente. Como nós, eles estão em condições de ver mais em um caracol ou uma concha do que apenas o animal em si, com apenas alguns traços eles conseguem lhes conferir novos significados.
Também parece quase certo que a linguagem dos homens das cavernas é altamente desenvolvida, pois para poder explicar mutuamente o que as conchas e os padrões de traços significam, eles precisariam de regras gramaticais para formular sentenças. Frases muito mais elaboradas do que apenas sons aglutinados.
Os habitantes das cavernas de Blombos provavelmente não só se pareciam com modernos seres humanos, mas também pensavam como eles.
O que fez com que o homem se tornasse um criador de cultura? Alguns pesquisadores acreditam que houve alguma mutação genética em seu genoma que possibilitou um novo modo de pensar.
Mas a explicação pode ser muito mais simples. Talvez os grupos de hominídeos tivessem crescido constantemente no decorrer dos milênios. E isso teria gerado a necessidade de desenvolver técnicas culturais e, ao mesmo tempo, uma linguagem para comunicação; pois, quanto maior a comunidade, mais complexo o sistema de comunicação e de raciocínio.
Essas habilidades provavelmente também possibilitaram que esses seres desenvolvessem armas completamente novas. Alguns artefatos encontrados nas cavernas de Blombos se parecem com pontas de lanças de ossos, como as que os sãs empregam ainda hoje. Algumas pedras pontudas, trabalhadas dos dois lados, também poderiam ter servido como armas, possivelmente como pontas de lanças. Mas não se sabe com que tecnologia esses projéteis de fato atingiam os seus alvos; sabe-se apenas que o Homo sapiens havia encontrado um meio para abater presas a uma distância bem maior.
            

  Tradicionalmente, os sãs caçam com estilingues, lanças, arcos e flechas. Para abater antílopes, por exemplo, as pontas das flechas são preparadas com o veneno de determinadas larvas
Caçadores da Idade da Pedra muito mais recentes desenvolveram um aparato de lançamento no qual eles enganchavam as lanças - os chamados atlatls, ou atiradores de lança (cuja utilização só é comprovada para um período de 20.000 anos atrás). Com um movimento oscilatório do braço pode-se lançar a arma a mais de 40m de distância com o artefato.
Quem caçar apenas com uma lança, por outro lado, é obrigado a se aproximar a poucos metros da presa, com o risco de ser chifrado ou pisoteado por ela.
Naquela época, portanto, há 75.000 anos, os humanoides não possuíam apenas uma linguagem altamente desenvolvida e um novo jeito de pensar, mas eles também haviam desenvolvido uma técnica bélica que lhes proporcionou vantagens decisivas. Agora morriam muito menos caçadores e eles conseguiam abater suas presas muito mais frequentemente do que antes. Isso lhes possibilitou alimentar famílias maiores. O número populacional começou a aumentar.
Talvez esse crescimento tenha desencadeado um movimento migratório na África, que modificaria o mundo. Também pode ser que o clima tenha começado a mudar e que as prolongadas secas tenham influenciado a busca de alimentos, obrigando os homens a partir dali.
Talvez esse crescimento tenha desencadeado um movimento migratório na África, que modificaria o mundo. Também pode ser que o clima tenha começado a mudar e que as prolongadas secas tenham influenciado a busca de alimentos, obrigando os homens a partir dali.
Os migrantes são atraídos para as margens do Mar Vermelho, onde há abundância de peixes e moluscos. E como naquela época o nível do mar estava cerca de 50m mais baixo que hoje, eles conseguem chegar sem problemas à Península Arábica. Mas não se assentam ali. Somente algumas famílias permanecem na região. Os outros provavelmente vagueiam ao longo das áreas ricas em peixes da costa peninsular e prosseguem em sua jornada rumo ao leste.
     

 Quando estão em busca de presas, os caçadores sãs frequentemente andam durante horas pelo escaldante Deserto do Kalahari. Manter-se de pé sobre uma perna só é uma posição tradicional de caça, possivelmente para relaxar os músculos
    

  Como há milhares de anos, os homens do povo sã ainda percorrem o Deserto do Kalahari, no sul da África, como caçadores primitivos e nos transmitem uma ideia de como os primeiros Homo sapiens podem ter vivido
Ano após ano, a caravana só percorre poucos quilômetros. Ainda assim, os descendentes dos primeiros migrantes conseguem chegar à extremidade do Sudeste Asiático há cerca de 55.000 anos. Como o nível do mar está mais baixo, o continente asiático se estende muito além da atual Malásia, incluindo também Sumatra, Bornéu e Java. Diante dos peregrinos se estende um estreito e atrás deste um continente que engloba a atual Austrália, Nova Guiné e Tasmânia.
Como eles sabiam o que se ocultava atrás da "estrada aquática", de quase 90km de largura? Será que eles observavam a rota das aves migratórias? Ou teriam sido atraídos pelo clarões de gigantescos incêndios florestais no horizonte noturno?
De todo modo, é aqui, neste ponto, que o Homo sapiens se transforma definitivamente em navegador. Ele constrói balsas de toras de madeira amarradas e se atreve a tentar a travessia. E finalmente chega ao despovoado continente australiano.
MAS O HOMEM MODERNO não coloniza apenas o Sul da Ásia e a Austrália. Alguns grupos que tinham se separado anteriormente da grande caravana rumaram para o interior da Ásia e da Europa (alguns podem ter chegado à Europa pelo levante).
Há 40.000 anos, o Homo sapiens também já perambulava pela atual China. Na caverna de Tianyuan, perto de Pequim, os restos mortais de um desses hominídeos recém-chegados foram preservados até os dias de hoje. A análise de seus ossos comprovou que aqueles hominídeos se alimentavam regularmente de peixes. E, como sugere a forma dos dedos de seus pés, eles aparentemente já estavam habituados a usar calçados rudimentares.
Mas o Homo sapiens continua não sendo a única forma humana na Terra. Em suas peregrinações pelo Sudeste Asiático ele provavelmente já cruzou com populações muito antigas de Homo erectus. Ossos encontrados na ilha indonésia de Java indicam que os homens pré-históricos permaneceram durante quase 2 milênios em determinados lugares.
E agora ocorre outro confronto no sul da Sibéria. Nos montes Altai, o Homo sapiens não apenas encontra neandertalenses, mas também outro parente mais distante: o "homem de Denisova", descoberto apenas recentemente.
Quase nada se conhece sobre esta espécie, exceto seu genoma, extraído de um fragmento de um osso da mão. Esse DNA difere nitidamente daquele do Homo sapiens e dos neandertalenses.
Será que naquela paisagem da Era do Gelo havia três formas humanoides lutando pela sobrevivência?
Não se sabe exatamente o que ocorreu, mas está claro que, no fim, somente o homem moderno permaneceu nessa região. E ele resistiu até mesmo ao frio ártico, pois há cerca de 30.000 anos, seres humanos viviam às margens do Rio Jana, no norte da Sibéria, a cerca de 500km ao norte do Círculo Polar Ártico. Partes das lanças de marfim de mamute e chifres de rinocerontes-lanudos perduraram por milênios. Talvez tenham sido descendentes desses humanoides que chegaram ao leste da Sibéria e de lá cruzaram o Estreito de Bering há cerca de 15.000 anos chegando à América despovoada.
MUITO ANTES DISSO, há cerca de 45.000 anos, o homem moderno avançou da Ásia rumo à Europa e penetrou bem no meio do território dos neandertalenses que havia colonizado o continente há 200.000 anos. Foi aqui que os dois grupos humanoides se encontram novamente.
O Homo sapiens havia conquistado o sul da Ásia rapidamente, mas aqui, na Europa, reinava o Neandertalense, um artista em sobrevivência, acostumado ao clima rigoroso e dotado de uma constituição física muito mais musculosa e robusta que a dos intrusos.
Durante mais de 10.000 anos os dois tipos humanoides lutam pelos escassos recursos no continente castigado pelo frio. Mas então o Homo sapiens mostra que é ligeiramente superior: ele possui uma tecnologia mais aprimorada, um raciocínio mais flexível e redes sociais mais amplas e estruturadas, talvez tenha conseguido se adaptar melhor à luta de deslocamento do concorrente, além de se multiplicar mais rapidamente. Seja como for, o território dos novos colonizadores aumenta de ano em ano, enquanto a área habitada pelos neandertalenses encolhe paulatinamente. Nessa acirrada luta de competição por dominância, os Neandertalenses são empurrados cada vez mais rumo ao leste.
Talvez seja justamente esse conflito desgastante que tenha fornecido um estimulo adicional para o desenvolvimento dos recém-chegados. Ou talvez as duas espécies humanoides tenham se envolvido em uma espécie de competição cultural, que culminou em uma explosão de criatividade, pois os Neandertalenses, também, começam a manufaturar lâminas e objetos ósseos inéditos; além de produzirem mais ornamentos, como pingentes simples de dentes de animais perfurados.
Mas na Europa o Homo sapiens experimenta um florescimento cultural como nunca fora visto antes: ele cria verdadeiras obras de arte, de uma qualidade até então desconhecida. Como se ele sentisse a necessidade de reafirmar sua própria identidade; separar-se claramente de outra cultura. As pinturas rupestres, desenhos de pessoas e animais, são testemunhas da magistralidade dessa espécie; pois somente quem possui fantasia e capacidade de imaginação, quem é capaz de se transportar em pensamentos para outros mundos através da pintura é capaz de produzir uma arte desse gênero.
Onde quer que esses homens modernos apareçam, eles exibem inequivocamente esse potencial de criatividade. Por exemplo, na caverna de Chauvet-Pont-d’Arc, no sul da França.
Há 36.000 anos, os primeiros Homo sapiens provavelmente entraram se arrastando nesse buraco escuro, tateando apenas na fraca luz de sua tochas rudimentares e penetram na terra até uma profundidade de 400m. Com carvão vegetal de suas fogueiras e pedras de ocre vermelho eles pintaram nas paredes representações surpreendentemente fidedignas: leões, mamutes, rinocerontes, bisões. Em uma protuberância rochosa ainda se vê uma Vênus com o órgão genital exageradamente explícito.
Quem eram essas pessoas que ousaram penetrar tão profundamente em uma caverna escura e assustadora? Um dos visitantes deixou suas pegadas impressas no chão de lama: seus pés são pequenos e provavelmente pertenciam a um menino de uns 8 anos.
Será que eles utilizam a caverna para realizar ritos de iniciação? Será que um xamã introduzia adolescentes no mundo imaginário dos homens pré-históricos? Um mundo povoado por espíritos animais e uma deusa da fertilidade?
De todo modo, a arte dos imigrantes reproduziu reiteradamente imagens de mulheres exuberantes. Na atual região sul da Alemanha eles entalharam, há quase 40.000 anos, uma Vênus de marfim de mamute, com quadris largos e seios enormes. As curvas grotescas e a vulva exagerada praticamente não permitem outra conclusão senão a de que o figurino é um símbolo de fartura e renovação; possivelmente criado na esperança de mais descendentes ou alimentos.
O cânone de desenhos desses colonizadores também incluem estranhas criaturas híbridas: seres com um corpo humano e a cabeça de um pássaro, um leão ou um bisão. Seriam hominídeos de máscaras, semelhantes às usadas ainda hoje por curandeiros de povos primitivos? De todo modo, parece certo que os hominídeos daqueles tempos já possuíam um ideário religioso e praticavam rituais, possivelmente até acentuados por música, como é sugerido por flautas pré-históricas.
Dos Neandertalenses, por outro lado, praticamente inexistem criações culturais comparáveis. Eles não produziram desenhos figurativos ou pequenas esculturas. E, há 27.000 anos, por fim, eles desapareceram por completo.
OUTRO PARENTE DO HOMEM MODERNO conseguiu sobreviver por mais tempo. Na ilha indonésia de Flores um outro bípede ainda vive por muito tempo, e, ao lado do Homo sapiens, parece ser uma relíquia de tempos pré-históricos. O Homo florensis, homem-de-Flores, mede apenas um metro de altura e seu cérebro é aproximadamente do tamanho do de um chimpanzé. Mas há 12.000 anos suas pistas também acabam por se dissipar.
Desde então, o Homo sapiens vive sozinho no mundo. Daquelas poucas centenas de migrantes que partiram da África há 60.000 anos descendem todos os povos asiáticos, europeus e americanos.
Mas não os atuais africanos negros. Estes são descendentes daqueles representantes de Homo sapiens que, embora desenvolvessem o raciocínio moderno, não participaram do grande êxodo passado.
O povo sã também pertence ao grupo que permaneceu na África. Marcadores genéticos em seu genoma deixam supor que os sãs se desviaram muito cedo da árvore genealógica da humanidade atual e desde então viveram comparativamente como um povo completamente autônomo e separado do restante. Durante milênios sua cultura permaneceu primitiva. Ainda hoje alguns grupos de bosquímanos coletam bagas e frutos silvestres e em geral caçam antílopes e outros animais com armas simples e rudimentares, exatamente como os nossos ancestrais da Idade da Pedra.
MARTIN PAETSCH, 39 anos, vive em Hong Kong e contribui regularmente para GEO. O fotógrafo DAN KITWOOD, 32 anos, vive em Londres, mas em 2009, conviveu durante algum tempo com os sãs no Deserto do Kalahari.

domingo, 12 de junho de 2011

Hillary alerta África sobre 'novo colonialismo

A África precisa estar ciente do "novo colonialismo" enquanto a China expande seus laços no continente e se concentrar em parceiros que possam ajudar a construir capacidade produtiva local, afirmou a secretária de Estado norte-americana, Hillary Clinton.

Questionada neste sábado em uma entrevista televisiva na Zâmbia sobre a crescente influência da China na África, Hillary disse que os africanos devem ficar atentos a parceiros que só negociam com as elites.

"Não queremos ver um novo colonialismo na África", afirmou Hillary em uma entrevista em Lusaka, a primeira parada em sua viagem de cinco dias pela África.

"Quando as pessoas vêm à África para fazer investimentos, queremos que elas sejam bem-sucedidas, mas também queremos que façam o bem", afirmou. "Não queremos que elas minem a boa governança na África."

A China injetou quase 10 bilhões de dólares em investimentos na África em 2009, e o comércio decolou enquanto Pequim compra petróleo e outras matérias-primas para abastecer sua crescente economia.

Durante sua presença no programa África 360, Hillary pediu investimentos "sustentáveis" de longo prazo e que vão beneficiar a África.

"Vimos que, durante o período colonial, é fácil entrar, tomar os recursos naturais, pagar os líderes e sair", afirmou.

A secretária de Estado citou os esforços norte-americanos para melhorar a governança política e econômica em países como a Zâmbia como exemplo de uma abordagem diferente.

"Os Estados Unidos estão investindo no povo da Zâmbia, não apenas nas elites, e estamos investindo para o longo prazo."

Os países africanos, segundo ela, podem aprender muito com a Ásia sobre como os governos podem ajudar a sustentar o crescimento econômico, mas disse que não via Pequim como um modelo de papel político.

"Estamos começando a ver um monte de problemas" na China e que vão se intensificar nos próximos dez anos, afirmou, citando os esforços chineses para controlar a Internet como um exemplo. "Há mais lições a aprender dos Estados Unidos e das democracias", disse.

A viagem de Hillary, que também a levará à Tanzânia e à Etiópia, tem o objetivo de realçar a política da administração Obama de ajudar os países africanos a superar desafios como a AIDS e a segurança alimentar e acelerar o crescimento econômico.



segunda-feira, 6 de junho de 2011

Entrevista com Mia Couto / Africa modernização e urbanização

Entrevista
A questão da modernização

A modernização africana, vista como integralmente vinda de fora, é tida como uma das grandes questões do continente. Modernizar seria destruir a identidade africana e impor um modelo subordinado às potências e a um modo de vida invasor. A sugestão agora é voltar toda a sua atenção para um trecho da entrevista do escritor moçambicano Mia Couto a esse respeito.
  




quinta-feira, 2 de junho de 2011

Vídeo/palavras para reflexão: As escolhas, as visões de mundo e de sociedade




Fonte: parte da obra. Por uma Outra Globalização: um encontro com Milton Santos.

O vídeo fala sobre a América Latina e também sobre a questão das escolhas que fazemos enquanto sociedade, em se falando de África e a temática do Blog ele esclarece muito do porque é importante se reconhecer enquanto individuo que pertence a uma nação.

Uma Experiência Significativa Com a Literatura Africana

Escrito por Consuelo Silva Almeira

2 - Angola na sala de aula
Na fronteira da mudança de valores e instauração de novas práticas, foi pensado e concebido o projeto literário Descobrindo a África, em uma classe de 4ª série do ensino fundamental do Colégio Estadual Princesa Isabel, localizado no bairro da Cidade Novaii.
Com o objetivo de despertar nos educandos o ideal de que a diferença pode ser bela e que a diversidade é enriquecedora e não sinônimo de desigualdade, o projeto desvendou a realidade de um país africano a partir da literatura. Durante o III bimestre de 2005, fizemos uma incursão literária ao conto africano As aventuras de Ngunga, de autoria de Pepetelaiii, tendo como fio condutor de todas as ações desenvolvidas, o reforço à auto-estima.
A escolha da obra deu-se, a partir dos questionamentos dos alunos sobre a dificuldade de se encontrar um texto no qual a personagem principal fosse representada por um negro. Apesar do desafio, identificou-se no CEAFRO (Centro de Estudos Afro- Orientais/UFBA), um exemplar do livro As aventuras de Ngunga. Com uma perspectiva bastante significativa, a obra relata, em seu bojo, as lutas nacionalistas angolanas, vivenciadas pelos negros para se libertarem da colonização européia, dando-lhes um tratamento de herói. A personagem principal é uma criança, que participa do movimento em prol da liberdade. Apesar do caráter revolucionário, a narrativa transborda de beleza e magnitude. Encontram-se presentes no texto os animais da floresta, os elementos da natureza, os espíritos e símbolos sobrenaturais, representantes da cultura africana.
Para que os alunos pudessem ter contato direto com o livro, decidiu-se ir a um Sebo da cidade e adquirir dez exemplares. Como a sala era composta de 20 alunos, optou-se por trabalhar com o texto, na própria classe, em dupla. A obra foi separada em capítulos, e a cada aula de Literatura, fazia-se uma retrospectiva do capítulo anterior e iniciava-se o próximo.
Logo no início da história, os alunos desvendaram que a personagem principal, Ngunga, era um menino órfão de 10 anos, que perdeu os pais em uma das lutas nacionalistas de Angola e, que vivia nas florestas africanas, de aldeia em aldeia, solitário e dependendo da ajuda dos habitantes até se envolver na causa libertária e se transformar em um guerrilheiro modelo.
Durante a trajetória da narrativa, pode-se identificar o processo de transformação psíquica que transcorreu com a personagem principal. Inicialmente apresentando-se como uma criança insegura que sofre muito, diante da solidão e da ausência de alguém que a ame realmente. "Por que ter de voltar? Ninguém o espera no Kimbo, ninguém ficaria preocupado se ele não aparecesse. Quem se lembraria de procurar Ngunga, o órfão, se morresse?"iv. A posteriore, Ngunga se transforma em um guerrilheiro que enfrenta suas próprias ameaças e aprende decifrar a realidade, identificando as armadilhas que aprisionam seu povo.
Com o decorrer da leitura da obra, os alunos passaram a se identificar com Ngunga. Para as crianças, era o herói ideal, que enfrentava todos os problemas e lutava contra as injustiças. Um menino valente que não deseja riqueza, honra, poder ou imortalidade, mas que aspirava à integridade, ao conhecimento e à sabedoria. Um dos trechos mais eloqüentes da narrativa, é quando o corajoso jovem desmascara o Presidente Kafuxi, ao alertar a comunidade sobre a exploração e a mentira na qual estavam vivendo.
Em contramão as denominações negativas em relação à cor preta, que podem levar as crianças negras, por associação, a sentirem horror à sua pele negra, o texto exerceu nos alunos uma influência positiva, posto que representou a figura do negro como herói e portador de valores éticos. Tal afirmativa foi constatada ao observar que no intervalo das aulas, as crianças dramatizavam as lutas revolucionárias angolanas e era uma briga para definir quem faria a personagem de Ngunga. Lacan elucida essa questão ao antecipar que: "[...] a identidade é formada, ao longo do tempo, através da interação com o "Outro" e que a construção de uma autoimagem positiva incide ao fato de existir referências que respaldem essa auto-imagem"v.
Texto na integra:
http://www.ueangola.com/index.php/criticas-e-ensaios/item/353-uma-experi%C3%AAncia-significativa-com-a-literatura-africana.html

1 - O currículo e a cultura africana
A escola é um local em que a diversidade cultural deve ser assegurada para que todos tenham garantido o direito de aprender e ampliar conhecimentos, sem serem obrigados a negar a si mesmo, ao grupo étnico/racial a que pertençam e adotar costumes, idéias e comportamentos que lhes são adversos.
Uma das finalidades do currículo é preparar os alunos para serem cidadãos críticos e participativos de uma sociedade democrática. No sentido de concretizar esse objetivo, urge que as instituições escolares se organizem de forma a contemplar as experiências das crianças, para que os alunos não vejam a cultura que comungam ser excluída ou descriminada, no ambiente escolar. Esse é o grande desafio da educação, fazer com que os alunos pratiquem e exercitem ações capazes de prepará-los para participar, ativamente, em sua comunidade.
Tomemos como ponto de partida Salvador, cidade multi-étnica e pluricultural, na qual as raízes africanas florescem cotidianamente, a comida e a música são presenças marcantes. Todavia, as literaturas afro-brasileira e africana são desconhecidas pela maioria da população, que muitas vezes, sob visão preconceituosa, associa as narrativas ao candomblé, por algumas apresentarem os orixás nos seus textos. Partindo do pressuposto que a literatura africana é vasta, torna-se primordial quebrar-se o paradigma de que somente o patrimônio europeu deve predominar e que as culturas das classes minoritárias, especialmente a indígena e a africana, só sejam contempladas no âmbito folclórico. Para tanto, deve-se buscar meios de conhecer a diversidade da população africana e, socializá-la no ambiente escolar, visando despertar nos educandos a autoestima em ser afro-descendentes. Uma das alternativas são os contos africanos, os quais revelam um mundo muitas vezes desconhecido, formado de reis, príncipes, orixás e de homens fortes que lutaram pela liberdade.[...]

terça-feira, 31 de maio de 2011

Uma mudança cultural que beneficia a todos.

África: Mutilação genital feminina está a diminuir

[Fotografia © AFP]

A mutilação genital feminina, prática comum como ritual de passagem em muitos países de África, Ásia e Médio Oriente, está a diminuir em vários países africanos, em especial no Quénia, Etiópia, Sudão e Egito, conforme revela um estudo apresentado esta semana pelo Centro de Pesquisa Innocenti, da UNICEF.

"Há várias comunidades em África que estão a abandonar a mutilação genital feminina/excisão, apesar de fortes pressões sociais no sentido contrário", congratularam-se os autores do estudo.

De acordo estes responsáveis, as campanhas educacionais têm surtido os efeitos desejados ao alertar a população que esta prática é considerada uma violação grave dos direitos humanos e representa um risco de saúde elevado.
O estudo mostra assim descidas significativas em quatro dos países, da percentagem de mulheres com idade entre os 15 e 49 anos.

Os números desceram no Egito, de 82% em 1995 para 63% em 2008, no Sudão de 79% em 1990 para 51% em 2006, na Etiópia de 60% para 31% entre 2000 e 2005, no Quénia, de 20% para 9,0% , numa década.

"A decisão de uma família praticar ou abandonar a mutilação genital feminina/excisão é influenciada por recompensas e sanções que são socialmente poderosas," explicou Gordon Alexander, diretor em exercício do Centro de Estudos Innocenti, citado pela Sic Online.

Os técnicos da UNICEF sustentam que os programas de abandono com maior sucesso "envolvem membros respeitados da comunidade, incluindo líderes religiosos e locais, e mobilizam redes sociais e instituições" com peso para influenciarem o resto da comunidade.

Fonte: http://www.boasnoticias.pt/noticias_%C3%81frica-Mutila%C3%A7%C3%A3o-genital-feminina-est%C3%A1-a-diminuir_4337.html
Saiba mais sobre  os resultados deste estudo clicando aqui.

segunda-feira, 30 de maio de 2011

Uma reflexão sobre autonomia, autodeterminação

Fonte: Quino, Toda Mafalda - da Primeira a Ultima Tira,1993.

Novas tecnologias e a ameaça à soberania na África

A África enfrenta hoje a ameaça de uma nova forma de conquista, uma conquista que está sendo possível graças à surpreendente revolução tecnológica na biologia, na física quântica, na química e na engenharia. Hoje, toda a matéria viva pode ser modificada através de engenharia genética; novas formas de vida criadas e lançadas no meio ambiente por meio da biologia sintética, as propriedades dos elementos e compostos drasticamente modificadas através da Nanotecnologia (tecnologias que trabalham na escala de átomos e moléculas) e da nano manufatura (criando, por exemplo, semicondutores em nível molecular, e até mesmo nano bombas não nucleares), e há uma convergência entre a nanotecnologia, tecnologias da informação e ciência cognitiva[..]
Ler sobre essa evolução é como a ler ficção científica. A diferença é que isso é real, está acontecendo agora. Estas tecnologias estão sendo desenvolvidas em um mundo que é totalmente desigual, em condições onde o acúmulo e o lucro imperam, permitindo que os ricos fiquem mais ricos a qualquer custo, enquanto a maioria empobrece. Eles têm se desenvolvido sob condições criadas ao longo dos últimos 30 anos que têm permitido às empresas monopolizar a fabricação em nível atômico - seja de matéria viva ou inanimada – e legitima a biopirataria corporativa em larga escala, com a África, um continente de extraordinária biodiversidade, sendo uma vítima significativa. Plantas que têm sido há muito utilizadas na África estão sendo patenteadas pelas corporações do Norte. Mas talvez o mais significativo de tudo para o continente é o fato de que os olhos das empresas estão procurando avidamente o lucro a ser alcançado a partir de centenas de bilhões de toneladas de matéria vegetal, que pode ser utilizada como fonte alternativa de carbono a combustíveis fósseis, permitindo a fabricação de combustíveis para os transportes, eletricidade, produtos químicos e plásticos, fertilizantes e todos os produtos que garantem o estilo de vida confortável do Norte, sob o pretexto de apoiar a "economia verde".
As novas tecnologias, ou mais precisamente, o controle corporativo das novas tecnologias representa uma ameaça em potencial e em crescimento para o continente. Um continente que já sofreu uma turbulenta história de conquista colonial e conquista econômica sob o neoliberalismo enfrenta, agora, uma conquista tecnologicamente mediada pelos oligopólios.
É uma característica das revoluções tecnológicas que a escala completa das implicações sociais, econômicas e políticas do seu uso é pouco apreciada, até que, como a maré crescente de um tsunami, varre tudo em seu caminho.
Estas tendências estão sendo desafiadas ao redor do mundo - nas comunidades locais, os movimentos nacionais e em reuniões globais das Nações Unidas como na Convenção sobre Diversidade Biológica e da Comissão sobre Segurança Alimentar da FAO (Food and Agriculture Organization). Cidadãos estão se unindo para expor os perigos dos governos cederem espaço às empresas para utilizarem novas tecnologias para resolverem problemas que, em sua raiz, exigem soluções social e política.
http://www.pambazuka.org/pt/category/features/69168

domingo, 29 de maio de 2011

Música na cultura africana

A cultura africana musical tem grande importância mundial. Ritmos originários da África subsaariana, em particular do oeste da África, foram transmitidos através do tráfego de escravos pelo Atlântico e resultaram em estilos musicais como o samba, blues, jazz, reggae, rap e rock e roll.

O Mundo de olho na Àfrica

Apesar de devastado pela colonização, o continente africano ainda tem muito a ser exolorado. Países em pleno desenvolvimento como a China aproveita da pobreza e da miséria, principalmente em países destruídos por guerra civil, exploram riquezas em troca de obras de infraestrutura. Será que podemos falar em novíssimo colonialismo?

sexta-feira, 27 de maio de 2011

sábado, 21 de maio de 2011

África Subsaariana

O IDH sintetiza a verdadeira tragédia humana que assola a África Subsaariana. Os 26 países do mundo piores colocados no ranking mundial estão situados nesta região, onde cerca de 30% da população sofre de subalimentação crônica, a esperança de vida é em média, inferior a 50 anos e mais de 60% da população adulta é analfabeta.

terça-feira, 17 de maio de 2011

O gigante que aos poucos desperta

Seguindo a linha de contestação e de aprimoramento sobre o que se entende por continente africano, incluimos a postagem  de um capítulo do documentário "Por uma nova globalização" realizado com Milton Santos em 1994.
Frutos de um "mesmo período" de colonização tanto a América Latina como a África tem muito aprender com o passado.

 Fonte: Video editado. Parte da obra "Por uma nova Globalização, com Milton Santos". 

domingo, 15 de maio de 2011

A arte a cultura e a autodeterminação

Na busca de autonomia e da consciência, de que são capazes de se autodeterminar, nasce um novo pensamento entre os jovens africanos que começam a buscar em si e em sua história, as bases para re-construção do continente.
Ondjaki escritor angolano no Programa Roda Viva

Um território repartido

  • Entre os séculos XV e XIX, os países europeus estabeleceram relações com várias sociedades africanas em busca de bens como ouro, prata e marfim, e, principalmente, de escravos. Instalaram-se em feitorias, presídios e portos, essencialmente no litoral.
  • O período colonial africano (ocupação efetiva com administração e burocracia, presença de forças militares e demarcação rígida das fronteiras) foi um processo iniciado no final do século XIX e finalizado por volta de 1914.
  • Nas descolonizações (nas décadas de 1960 e 1970), os estados recém-independentes herdaram uma organização do território fundada numa repartição bastante complexa e na lógica mercantilista de exploração dos recursos naturais das colônias (eixos dirigidos aos portos).
  • Os atuais 54 países africanos estão divididos por 109 fronteiras internacionais que medem, no conjunto, cerca de 80.467 quilômetros.
 
África.

  • As fronteiras modernas na África são vistas como “artificiais”: 26% delas seguem linhas conferidas pelo relevo natural (como montanhas, rios, linhas divisórias de águas); quase a metade corresponde a linhas astronômicas; 30% correspondem a linhas matemáticas.
  • As fronteiras também dividem o que antigamente foi denominado de áreas tribais, as quais hoje aparecem mais como “áreas culturais”. Ainda que tenhamos em mente a complexidade e a impossibilidade de se atribuir limites exatos a fenômenos tão flexíveis como “áreas culturais”, podemos afirmar que, na África contemporânea, poucas fronteiras coincidem com essas áreas que, entre 131 e 187 delas, estão divididas entre um ou mais estados.